Um sonho que me fez sorrir

Saímos de Beja depois do meio dia. O friozinho nas mãos já se sentia, pois à saída da bomba levámos uma latinha fresquinha para abrir o apetite. Fizemo-nos à estrada e a paragem obrigatória em Santa Margarida do Sado não falhou. “Não tenho latas, mas levem as garrafas e de regresso deixem num saquinho plástico no postigo da porta”. Ainda estamos no Alentejo. Sente-se a pureza das pessoas que acreditam que falamos verdade. Os cachecóis verdes e brancos também ajudam a credibilizar a coisa. Seguimos, e à passagem da portagem lá fizemos o nosso melhor sorriso para a loira de olhos azuis que nos fez o troco. Gostamos das pessoas! A máquina só diz “insira o seu cartão”, e “retire o recibo”. O “boa viagem” é diferente quando saído dos lábios carnudos de uma barbie, mesmo que os mesmos mal pintados façam lembrar que estamos em crise e que a Yves Rocher também tem coisas baratas que besuntam à mesma e dão um ar sexy/ordinarote as moçoilas...

Chegámos a Alvalade cedo. Carro estrategicamente colocado no sentido Sul, e caminhámos para o Alvaláxia. Ainda não cheira a derby, mas temos a 1ª alegria do dia: O Bruma tá convocado e vai jogar. Almoçamos no parque de terra uma marmita com umas coisas que levámos de casa (tá aí a crise lembram-se?) e o aglomerado de gente começa a ser muito. Cantam-se as 1ªas cantigas, lançam-se os 1º gritos de paixão. Incrível como no estado em que estamos, o ambiente é lindo! Famílias com crianças, casais alegremente de mão dada com elas orgulhosas e eles fudidos da malta mandar um olho galifão, a polícia tranquila de capacete na mão e um cair de noite esplêndido, com o fumo dos assadores de castanhas e misturar-se com a cacimba que começa a cair. Cidadãos comuns de regresso a casa juntam-se à festa, e cantamos alegremente, com os miúdos no autocarro com as mochilas às costas e o estômago vazio a sorrirem através dos vidros embaciados.

Chegamo-nos à porta de entrada. As filas diluem-se alegremente pois a revista é feita de forma suave. Os stewarts hoje sorriem, e os polícias não resistem a beber um gole de cerveja que, logicamente, tem de ficar à porta. “Leve lá as maçãs que são para comer” diz um ao ver que na mochila sobrou uma queijada do Luis da Rocha e 2 maças reinetas compradas no Lidl. Sentados nos lugares vemos que vai haver uma comunicação da Direção. Numa auditoria efetuada, o passivo desceu uns bons milhões! Godinho Lopes, presidente, informa que as obras de fecho do fosso vão começar na próxima semana, anuncia a entrada de capital de 2 investidores, ficando o Sporting com a maioria de capital da Sad. Godinho Lopes, vice para o Futebol, apresenta um ponta de lança para Janeiro. Lukako, emprestado pelo Chelsea! Finalmente encontraram a cura para Izmailov que vai jogar e garante que o joelho não dói nunca mais. Godinho Lopes presidente volta a falar, e anuncia que afinal não haverá baixa no orçamento do futebol, e que já conseguiu vender, por 17 milhões, Jeffren para o Liverpool, por 25 Elias para o Zenit, e negoceia para a Arábia Saudida a saída de Gelson por números ainda não divulgados, mas nunca abaixo dos 22 milhões. O Estádio está em festa! Godinho sai de cena, e entram os artistas! Vercauten, que finalmente teve ordem para contratar um adjunto, revoluciona o onze. Eric mantem a titularidade, Rinaudo recupera a braçadeira, João Mário e Bruma entram diretos para o onze! E no adversário joga Luisão!

Quando faltavam 22 minutos o estádio saltava o “quem não salta é lampião”, ainda mal refeitos da surpresa que foi o presidente ter apresentado à votação dos sócios o cenário de eleições antecipadas, a realizar na 3ª feira, em que os sócios do interior finalmente podem votar. O homem tem-nos no sítio e quer ir a sufrágio novamente, pois tem projeto para apresentar e acredita no seu valor! Começa o jogo. Somos dominantes! Fazemos pressão a 2/3 do campo e invariavelmente conseguimos ganhar a bola ainda no meio campo adversário. Os centrais não perdem um lance, Ínsua sobe a preceito e o menino João Mário segura a batuta, passados os minutos iniciais onde começou a jogar ao 1º toque com medo de assumir. Bruma e Capel são 2 setas apontadas e servem Wolfs que hoje, já marcou 2! Carrilo foi lançado para a ultima meia hora e partiu tudo, expulsando finalmente Maxi Pereira que à 50ª falta pelo 30º jogo consecutivo, é expulso!

Termina o derby. A equipa despede-se em comunhão com os adeptos. Caem lagrimas dos olhos da maior parte dos atletas, que suados e amachucados depois de hora e meia de batalha por cada bola como se fosse a ultima, sentem das bancadas o carinho que, têm a consciência, ate agora não tinham merecido. Finalmente alguns percebem a grandeza do clube. O calor da sua massa adepta onde, não por os 3 pontos, mas sim pelo reencontro com o eterno amor da vida daqueles que, dia a dia, noite a noite, sofrem pelo seu clube. E recolheram ao balneário, cientes que a seguir a este dia nada será como dantes. Que a divida de gratidão ainda vai a tempo de ser paga. E juntos prometeram, juraram em conjunto: vamos dar tudo por esta gente a partir de agora. Vamos começar de novo que hoje, olhos nos olhos com toda esta gente, vimos, de facto, o que é o Sporting e o que significa para todos.

À saída do estádio encontrei o Sá Pinto. De cachecol como eu . Não resisti, abracei-me a ele. Chorámos os 2! Eu parei, o choro continuou…Sá que é isso pá era o meu filho Luis! Tudo não passou de um sonho, e era ele que eu abraçada e beijava. Perguntou-me “pai porque choras? Mas estas a sorrir também?”. Nada filho, gosto muito de ti. Foi só um sonho. Um sonho bom, que, quem sabe, pelo menos algumas partes se possa tornar realidade na 2ª feira.

Cajó