Azião
A passada semana não
houve “cantinho”. A semana ficou marcada por a deslocação a Bilbau e caramba,
entre festas e viagens, também por vezes temos de trabalhar um bocado, vá-se lá
saber porquê. Mas pronto, entre aventuras para comprar bilhete, até às peripécias
para alugar uma carrinha, pelas 5 da manhã saímos de Beja. 900 kms
esperavam-nos, movidos por aquela fé inabalável que nos faz correr, rir, chorar
e delirar. Movidos também pelas geleiras que iam cheias e que à entrada na
fronteira já estavam duas vazias, lá seguimos, rindo e cantando penetrando por
essa Espanha acima… A chegada fez-nos lembrar Portugal no ano de Scolari:
janelas ornamentadas com bandeiras, montras decoradas a preceito, eles de
cachecóis ao pescoço, elas de calças de gangas bem justas a fazerem-nos querer
conviver saudavelmente antes do jogo. Bilbau mostrou ser uma terra que vive e
respira futebol. Onde as pessoas se preocupam em ser simpáticas, onde sorriem à
nossa passagem, acenam ao nosso contacto, conversam acerca de futebol. Andar na
zona do San Mamés nas horas que precedem um jogo é uma experiência para quem
gosta de bola a não perder. Ou a experimentar um dia. Os copos jorravam entre 2
dedos de conversa, os cânticos saiam de forma natural, o convívio com os bascos
faziam-nos sentir em ambiente de final. Uma lição de civismo por parte de um
povo que historicamente tem um passado de luta, mas que identifica e separa
perfeitamente quem são os inimigos e os visitantes. A entrada no estádio foi
feita de forma calma, mas em 30 anos de bola foi a 1ª vez que me descalcei à
entrada de um estádio de futebol. Polícia de intervenção tranquila, stewarts
com uma sobranceria e falta de simpatia brutais, a pedirem sopapinhos nos
cornos e abraços de cotovelos em riste. Contudo, a fila de capacetes à nossa
volta com as gorras de assaltantes de bancos enfiadas na cara faziam-nos perder
qualquer ideia de “amizade mais chegada” com os senhores do colete verde
florescente, famosos por serem reforços de inverno de alguns clubes nos túneis
dos estádios e decidirem campeonatos. Adiante. O sector leonino era ao nível do
velhinho Vidal Pinheiro. Com uma rede de galinheiro à frente, daquelas que por
vezes ardem, e que nos fizeram sentir como prisioneiros em Alcatraz. Mas a
curva estava ao rubro. Um apoio incessante, que fez com que os bascos tivessem
confidenciado que fomos a melhor “afición” que passou por La Catedral nos
últimos largos anos. O jogo já sabemos. Um senhor chamado LLorente tratou de
nos dizimar. O golo do mal-amado Ricky, que voltou a decidir esta semana (e que
leva mais golos na 1ª época em Portugal que Liedson no 1º ano, para já não
falar no 1º ano de Acosta, os 2 que a par de Super Mário marcaram de forma
inequívoca a diferença dos últimos 9s que passaram por Alvalade) fez-nos
sonhar! Mas a 2ª parte trouxe uma azia daquelas difíceis de digerir, e que nos
marcará nos próximos tempos. Uma final europeia é uma final. Estivemos bem
perto. Ali ao alcance de uma mão. No final do jogo tivemos de comer a festa dos
bascos. Uma festa bonita para eles, mas que até aí marcou algo que não vemos
por cá. Quando ganhamos, e por muito que respeitemos o adversário, festejamos de
forma mais “agressiva”, gostamos de fazer uma “touradinha aos cabeçudos”,
gritamos à sua volta e de forma genuína temos aquele sentimento de “embrulha e
vai para casa”. Em Bilbau, no meio de uma festa impressionante, houve tempo
para nos darem os sentimentos. Houve respeito para, à nossa passagem, se gritar
Sporting e de forma sincera, quase se deixar de festejar para confortar os
adeptos que, a partir desta semana, ficarão umbilicalmente ligados, ou não
fossemos todos “leones”. Mas o azião foi grande. Eu quero que se lixe o
ambiente. Eu estou-me nas tintas para a recepção! Eu preferia estar a contar
nesta altura que tive de fugir à frente de adeptos erectos que se quase me
apanhavam (quase, atenção!), que no hotel me tinham tirado os colchões e as
almofadas, e que as imperiais afinal tinham purgante que nos fizeram parar de
meia em meia hora. Mas não. Fica o registo de 2 dias bem passados, com o último
meio dia em registo de cortejo fúnebre. No regresso à nossa santa terra,
ganhámos à Académica e a Champions está a uma mão. Na era Sá Pinto, apenas perdemos
6 pontos: Setúbal, onde falhámos um penalti, e Barcelos, com Bruno Paixão. Curioso
não é? Podíamos nesta altura estar a lutar, ainda, pelo acesso directo à liga
dos campeões. Para o que falta, apenas espero que o campeonato não acabe da
mesma forma que começou, com o Sporting a ser encostado por coisas. Coisas que
por vezes se passam, e esta época não foi excepção, ao nosso Sporting, em datas
específicas. Vamos acreditar!
Cajó
2 comentários:
Gostei muito da descrição dessa meia final, foi suberba!!! Abraço Grande Cajó!!!
Não sou sportinguista mas li a crónica com o agrado que um bom texto me proporciona. Passei por situações semelhantes de um gratificante convívio com adversários. Lembro-me de adeptos do Chelsea, do Celtic e dos 2 clubes de Sevilha. Uma outra mentalidade sem dúvida. Relembrei tudo isso, as horas de espera por um bilhete, as viagens animadas pra lá e as cansativas de volta fosse qual fosse o resultado. Lembrei-me dos meus amigos, companheiros de jornada que ficarão sempre marcados com aquela cumplicidade própria de quem viveu junto tudo isso. Por tudo isso, obrigado por este fantástico texto. Abraço Carlos.
Enviar um comentário