A falta de referências

Ter um puto com 6 anos e outro com 3 a serem adeptos do Sporting no estado actual é obra de um pai com as mãos do Patrício, o pé esquerdo de Balakov, direito de Ronaldo e cotovelos de Beto Acosta! Se o mais novo no infantário apenas tem de levar com alguns miúdos formatados a músicas que ficam no ouvido e que até algumas donas de casa troteiam quando  varrem o chão, sem saber do que se trata, ou com aqueles conhecidos que quando o vêm com pai (que educadamente lhe diz, “fala lá ao senhor filho”) só têm a dizer “atão pá, já és do Benfica?!” seguido daquele olhar sarcástico, quase maléfico que atiram à criança, e pelo canto do olho ao progenitor, que já rosna, o mais velho na escola já se vai apercebendo das constantes brincadeiras e da pressão que é ser do Sporting. Se ao período negro que passámos sem ganhar, em que de manhã a expressão triste era sempre a mesma (perdemos outra vez pai) tínhamos sempre a mesma resposta de que mesmo sem ganhar, o nosso clube é o maior seremos sempre do Sporting, a perca de referências é sem dúvida um flagelo, não apenas dentro do campo, como na constituição de uma massa associativa forte.

Em 6 anos de existência, o pequeno leão Luis Carlos já teve vários ídolos. Vários posters colados na parede do quarto (sim, no papel de parede, naquele sítio onde a mãe dá fita mas onde o pai se impõe e diz gritando ”……deixa lá o menino filha….”, se desatualizam quase a cada semana que passa. Nos tempos do Só Eu Sei Porque Não Fico Em Casa, João Moutinho-ex-maça-podre fazias as delícias. Era mais um menino como ele que ali andava no campo a jogar à bola. Depois Yanick Djaló deu nome ao Leãozinho que o acompanha no sono, fruto da sua crista e de ser “aquele escurinho que corre muito pai”. Passado uns tempos, Matias com a sua magia, numa fase em que o jogo já lhe dizia algo (e assim Djaló passou à história, naturalmente), era o eleito. Todos eles saíram, como tantos outros. O maior de todos, surgiu numa noite onde viu o pai com uma lagriminha no olho a seguir a um jogo. O Liedson, seu grande ídolo, ia sair do Sporting. Não percebeu porquê, perguntou e fez uma birra grande. Ainda até há bem pouco tempo falávamos dele. Revíamos vídeos no YouTube, nas fases onde o Pintinho Piu e o Spy davam algum descanso ao pessoal. O Liedson estava no Brasil, mas continua a ser do Sporting filho! E o Sá Pinto pai? Esse é igual, não tem trabalho mas é do Sporting!

Hoje para mim é um dia triste. É um dia em que me faz alguma comichão a chegada do Levezinho ao Porto. Do “nosso” Levezinho. Deixa ir o Moutinho, caga no Simão, o Izmailov se fosse preciso até o ia levar no meu carro ao Porto. O Viana deixa-o andar com o Custódio. O Varela é sem stress. O Veloso, vamos vendo os penteados na Nova Gente e na Selecção Nacional. Mas o Liedson não. Foi provavelmente a minha grande referência do Sporting na última década. O homem que fazia 50 jogos por época. O homem que me fazia ir a Alvalade acreditando que sempre iria marcar. O tal que nunca se cansa, e que vai a todas. Que me fez manter a forma invejável que tenho com as pernas impecavelmente torneadas e esbeltas (pronto, exagerei um pouquinho) tantas as vezes que me fez levantar da cadeira a festejar com ele, ou a saltar com ele mais alto que o Morto (ndr: o que usa a braçadeira do clube de Carnide), ou a esticar-me naquele cruzamento do Pereirinha em que a bola saia quadrada mas que teimosamente ele ia buscar sabe-se lá como e marcava. Indiscritível esquecer a sua despedida no centro do campo em Alvalade! Inesquecível!. Não te censuro Liedson. Custa-me, parece-me mal, mas entendo-te. Tens 35 anos nas nalgas e dão-te um bom contrato. Sei que se tivéssemos batido a nota estavas connosco. Sei que nunca irás festejar um golo contra nós (1º porque não vais marcar, mas mesmo que seja um colega teu, não festejarás) porque a relação que tiveste com os adeptos, com o povo, marcou-te tanto quanto a nós. Mas caramba…ter de explicar a tantos jovens que o Liedson vai jogar para o Porto, é complicado. E destas pequenas/grandes coisas se fazem as místicas, as massas associativas, os verdadeiros adeptos. Não temos referências.

Resta Patrício. A última. Por aqui se deverá começar a olhar e a construir o futuro. Criar-se uma base, seja em termos de jogadores, seja em termos de estrutura. Até ao fim do mês trememos com o que há-de vir, numa época onde normalmente esperamos prendas… esta desejo que acabe rápido. E agora não me lixem: o cabrão do Leãozinho foi rebatizado, chama-se Wolkswinkel, e o puto adora o gajo! Se o venderem… chamo-lhe Joãozinho, e não João, como vocês querem!

Nota 1: Se ganharmos domingo ficamos em 5º. Um lugar acima da minha linha de água, se é que me entendem…

Cájo